Oi! Talvez só de ler esse título você já se identificou, afinal, quem nunca, né?
Mas deixa eu perguntar algo que a gente nem sempre relaciona diretamente com a comida:
Você já viveu uma desconexão entre aquilo que está sentindo e aquilo que representa para os outros e para si mesma?
Eu já, principalmente nos anos mais intensos dos meus transtornos alimentares. E voltei a me sentir assim nas últimas semanas.
O sentimento de um “eu” meio frankstein não é exclusividade de quem tem ou teve anorexia, bulimia ou obesidade. Não se permitir identificar sentimentos negativos, se sentir culpada pelo que está sentindo e representar que a vida está ótima, obrigada é uma “ginástica” muito cansativa e talvez você, infelizmente, já se viu nela também, não é?
É por isso que hoje vou propor uma pausa nas transmissões gastronômicas para falar de saúde mental, porque, se eu comecei a cozinhar foi justamente para me curar.
Se alguém me perguntar se eu fiquei satisfeita com esse hamburgão veganissimo vou dizer: claro que sim! Eu estava numa fase muito rigorosa com minha alimentação e me permitir um almoço assim foi libertador.
Mas sabe o que é tão prazeroso quanto isso?
Entender que a gente não coloca só alimento físico no nosso prato. Nossos relacionamentos, afetos,trabalho, auto-estima, estudos, tudo isso nos alimenta também. E quando esses alimentos se tornam tóxicos, é hora de parar.
Encostar o garfo.
Respirar e olhar para o prato para identificar o que está demais e o que está faltando ali. Nenhuma gostosura alimentar ou dieta maluca vai suprir o espaço dessa ausência ou excesso.
Quando ignoramos isso e continuamos simplesmente nos punindo com comida ou com falta dela, nos afastamos dos nossos sentimentos e começamos a representar não apenas para os outros, mas para nós mesmas.
Eu sei que rola toda uma pressão para agirmos assim, e estou escrevendo aqui para me lembrar de algo que eu achei que já tivesse entendido para todo sempre da minha vida:
Eu posso sentir coisas negativas, por mais alto-astral, solar e divertida que eu seja.
Eu posso inclusive exercer meu senso crítico dentro das experiências fantásticas que vivo, como morar na Europa ou estudar na Le Cordon Bleu.
A dissociação entre aquilo que estou sentindo e aquilo que estou expressando voltou a interferir na minha relação com a comida. Tenho tido vontade de falar muitas coisas que tenho silenciado com medo de soar ingrata, arrogante, ou até mesmo das consequências acadêmicas que eu possa vir a sofrer.
Tenho “engolido” sem ter tempo de digerir e o lado bom desse momento é que, depois de muitos anos de terapia, hoje tenho condições de reconhecer que não dá para seguir guiando um carro com as pecinhas todas caindo. É hora de puxar o freio, sair da contra-mão e voltar para minha estrada.
Tivemos 4 dias de intervalo do curso que estou fazendo na Le Cordon Bleu de Plant Based Culinary Arts e vim visitar o Paulo em Lisboa.
Pude enfim sentir que, por mais que o curso seja incrível, tem muita coisa que está difícil para mim. E se não falei dessas coisas até agora, é simplesmente porque eu estava tapando tudo com comida ou falta de comida para não ter que lidar com esses sentimentos.
Esses quatro dias foram fundamentais para eu recuperar meu eixo e dá um certo medo voltar para o desafio que está sendo estudar em Londres, sozinha, longe da minha zona de conforto, em uma escola que respeito mas que também não me identifico 100% (vou voltar a isso em outro momento).
Ao mesmo tempo, só de poder compartilhar o que estou sentindo já faz com que eu me sinta mais forte, porque sei que comigo e com vocês eu posso ser eu mesma, e não a pessoa que tem a vida e alimentação perfeitas.
Sabe o que rolou também? Um medo de não honrar vocês que me escrevem dizendo “ah, meu sonho é fazer esse curso!” ou “meu sonho é morar em Londres!”. Esse é o meu sonho também e estou vivendo ele, mas não sem noites e dias de muita ansiedade, insegurança e questionamentos.
E se eu tô abrindo tudo isso com vocês é para (me) dizer duas coisas:
1. Se você tá cansada de representar coisas diferentes do que está sentindo, respira fundo e legitima seus sentimentos. Eu sei que no instagram a vida é geralmente sempre linda, mas a gente ainda pode sentir que tá chovendo dentro de casa sim. Até porque, literalmente, está e por mais positivas que sejamos, somos sensíveis e nos afetamos com as coisas do mundo, da nossa sociedade, do nosso corpo, das nossas vidas.
2. Para fazer jus à mim mesma e à vocês que me acompanham e que querem saber tudo do curso e da vida em Londres, vou começar (ou melhor, voltar) a abrir mais o coração no instagram tá? Talvez isso tire um pouco o espaço das receitas, dos pratos que estou aprendendo a fazer, das aulas incríveis, dos ingredientes que nunca vi nem comi. Mas tudo isso eu vou poder compartilhar com vocês depois e com mais tempo, não é mesmo? Agora preciso pegar meus pedacinhos para seguir forte do jeito que gosto, expondo também minhas fragilidades e sendo transparente em dividir com vocês a minha vida real.
Ai, que alivio. Sério.
Amanhã vou retomar meus estudos com mais leveza e integridade. Espero que vocês também se permitam sentir. E não tô fazendo aqui nenhuma apologia dos sentimentos negativos. Tô simplesmente nos lembrando que eles se manifestam às vezes dentro de nós e que a gente não precisa ficar fingindo que tá tudo bem. A gente pode pedir ajuda enquanto se move para reverter esses sentimentos. Inclusive para nós mesmas, retirando uma máscara que não nos serve.
Um beijo e até mais,
Luisa
Querida Luísa Parabéns,
Obrigada por compartilhar seu conhecimento, suas receitas, seu sorriso, seus sentimentos. Te conheci a pouco tempo, em um evento no Mercado das Torcatas, quando nos ensinou a fazer uma sopa fria de beterraba maravilhosa!!!
Parabéns pela coragem de abrir seus sentimentos, suas dificuldades e receios, certamente te dará mais força para vencer novos desafios e continuar a trilhar este lindo caminho em busca de seus sonhos, e continuar nos inspirando.
Abracos
Débora Muzzi
Oi Luisa!!!!... estava aqui a ler seu depoimento e me identificando sim!... sair da nossa zona de conforto mexe muito mais do que imaginamos, mas isso é bom... Eu por muitos anos vivi numa zona de conforto que na verdade não me era prazerosa, mas era o que eu sabia e podia viver no momento... quero dizer com isso é que, ao sairmos dessa zona de conforto em busca de melhores caminhos para nossas vidas, muitas vezes, ou quase sempre, nos deparamos com vivencias que não são exatamente o que parece estarmos em busca, MAS devemos dar crédito a isso, e assim poderemos entender que tudo o que buscamos aprender, tem um ensinamento incrível e muitas vezes pessoal... eu com…